quarta-feira, 31 de maio de 2023

Não era a mais bela de toda a fazenda

Mas todos a tinham em conta de prenda

Que só gente fina poderia ter.

Gostava de um negro, mas não revelava,

Pois com seu silêncio, seu negro livrava

De mil sofrimentos, e até de o perder.


Mas tão atraente atraía de fato

E embora vivesse com todo o recato

Não tinha por onde esconder a beleza,

E ao vê-la, quem visse, não resistiria

E tendo poderes, a ela faria

Propostas de amor em graus de baixeza


Chegado já homem da grande cidade,

Pra onde seguira com 12 de idade,

Estava o pedante filho do Senhor,

Olhou a pequena, sentiu-se nervoso,

Pensou, prontamente, num plano engenhoso

Para conquistar da mulata o amor.


Mas não lhe ocorreu que a mulata guardava

Seu sonho de amor para o negro que amava

E ouviu, revoltado, o "não" que ela deu.

Irado, humilhado, chamou o feitor:

- Se ela me nega, por bem, seu amor,

Pedindo clemência esse amor será meu.


Com seco estalido, ia velha chibata

Fazendo no corpo da linda mulata

Os sulcos sangrentos, retrato da dor.

E embora calada, sofrendo, gemendo,

Baixinho, chorando, insistia dizendo:

- Em vida, não dou este corpo ao senhor.


E estava no tronco, já toda caída

Com o sangue a escorrer-lhe, numa só ferida.

E a língua de couro cortando ainda mais,

De súbito, um tiro surgiu e, certeiro,

Prostrou o algoz, que se contorce inteiro

E, caindo ferido, não se erguerá jamais.


Os negros que estavam de longe escondidos,

Saíram ao terreiro meio espavoridos:

- Que foi que fizeram com nosso feitor?

Ninguém deu resposta, ninguém disse nada.

Mas a explicação para a turba espantada

Surgiu do revólver, na mão do feitor!

                                   

(Niterói/1963)       


-------------------------------------//---------------------------------------


Eu pensei que você

Estivesse brincando

Quando disse que

Estava chorando,

Que ia embora

Pra não mais voltar


Francamente,

Não pensei que dissesse

A verdade.

Sei, agora, por esta saudade,

Que, teimosa, não quer me deixar


                                     (25/10/1963)


839 - 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

APRESENTAÇÃO DO BLOG

Família de Guimarães Nato, nome profissional do jornalista e escritor Renato Guimarães (1924 - 2000), inicia agora o blog com as poesias, prosas e demais textos literários e diversos outros que ele deixou. (15/02/2018)

A família de Guimarães Nato, nome profissional do jornalista e escritor Renato Guimarães (1924 - 2000), inicia agora o blog com as poesias,...