Duas épocas...

Eu gostaria de haver nascido na época dos minuetos!...

- Os senhores me permitem o prazer de dançar com sua prendada filha?

E lá iria oferecendo o meu braço como apoio à mãozinha delicada da jovem dama...

Como eu gostaria de ter vivido naquela época em que não se era afeminado quando se oferecia a uma linda moça, uma flor!... Ou quando emocionado lia-se um soneto transbordando de lirismo, que dedicávamos à tal jovem!...

Como eu me sentiria feliz de me contar entre os viventes daquele século, em que havia honra, dignidade, onde a palavra dada era uma garantia indiscutível! Como eu me sentiria feliz se vivesse no tempo em que havia respeito, moralidade, bons costumes! Em que existia responsabilidade, brio, compostura!

Mas não; vivo no tempo da pouca vergonha, da pornografia, dos homens que traem a razão, o direito, por ninharias - pontos de destaque, dinheiro, predicados - ninharias diante da honra, da moralidade.

Como eu desejaria ter vivido, ter sido contemporâneo de um Rui Barbosa, de Olavo Bilac, Emilio de Meneses, Carlos Gomes, Pedro Américo.

Acostumado às piadas pornográficas, que outra coisa não são que deficiência de cultura, como eu haveria de me deliciar com as sátiras, com o realmente bom humor daqueles cérebros, daqueles gênios da época dos minuetos!...

Mas nada, não nasci naquele século. Então, meu Deus, por que não nasci eu sem esses sonhos, sem esse lirismo, sem essa revolta contra a mentalidade do meu tempo? Se eu sou desta quadra, por que me deste um coração, uma alma do tempo dos minuetos?!

(Rio, 1946)

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